A exposição de Christian Cravo - Mariana, tem como objeto central a memória e transporta através de objetos, corpo e ambiente o individuo até Mariana, que externa muito além de lama. Uma realidade mórbida e ainda lamentável ascende diante de indignação e profunda tristeza. O Autor afirma não ter manipulado nenhum dos objetos que fotografou mantendo-os desde o desastre de Mariana.
A obra "Farpas" externa roupas intimas, objetos que guardam o âmago, algo tão vulnerável em geral como o ser humano, as pessoas que lá viviam em relação a lama devastadora que tomou vidas inocentes. Sobre tudo a obra reflete essas vidas penduradas em farpas cruéis, rígidas e pontiagudas que atravessam violentamente memoria, intimidade e corpo, mantando-os, retalhando-os e apagando-os.
A obra "Estar" da posição de observador é colossal e vazia, é repleto de memória porém frágil, com sensação de que a presença endurece e quebra , como a lama. Faz refletir que "estavamos aqui , nos nossos aposentos, tão quentes, hóspitos e particulares e agora somos lama, fomos levados", embora a empresa responsável pelo desastre SAMARCO seja responsável pelo desastre por não tomar as devidas precauções, ela se mantem sentada, esperando esses fantasmas se apagarem, após pagar um valor muito pouco em função de um desastre que levou vidas , em um desastre irreparável.
A obra " Espelho d'água" externa a invisibilidade, a ausência e a morbidez. Além do total descaso com o meio ambiente, em um objeto que entende-se que deve-se avaliar sua aparência, checar se está tudo no devido lugar, novamente depara-se com lama. O objeto na verdade é uma panela ressignificada em "espelho" agora inutilizável, assim como Mariana, onde tentou-se morar, sobreviver, viver após a tragédia mas foi impossível diante de tanta ausência de vida. Tudo o que se vê é lama.
A obra "Matrimônio" mostra o rompimento com de um cotidiano que passa a se esvair. Uma união que é interrompida , a expectativa de felicidade e prosperidade que é manchada e suja, se torna insalubre, sem capacidade de dar continuidade, sem longevidade, pois findou, acabou... sem porquê.
A obra " José" é uma das mais fantasmagóricas, uma imagem clara de memória, de vestígios de quem um dia foi tão vivido em carne e osso, inconstante, instável, humano. Um reflexo de apagamento mórbido e depressivo, buscando uma forma de se manter de respirar, porém quase que completamente tomado. Uma obra que se olhar nos olhos vê a agonia, a tristeza até mesmo a saudade.
A obra "Anunciação" mostra a falta de esperança. A vitalidade, prosperidade, fraternidade sangra pela lama que tomou toda a cidade, que sem chance alguma de salvar-se surpreende-se com o anuncio do fim, da temida e desconhecida morte.
As paredes do local onde são exibida as obras são pintas de marrom para que quem entra sinta-se em Mariana, rodeado, sufocado tomado pela lama. Existem mais obras na exposição assim como no livro com fotos da tragédia publicado pelo autor. Vale a pena sentir e visitar para que a memoria permaneça.






Que forte esse relato e esses registros... Grata pela partilha da sensibilidade!
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